Cantarinhas de Pinela

cantarinhas de pinela_min

As pequenas cantarinhas que deram fama à Feira que no 3 de maio decorre em Bragança são, talvez, as peças mais conhecidas na atualidade da louça de barro de Pinela mas nem sempre assim foi. Esta localidade, com forte tradição na olaria, foi em tempos o maior centro de produção de louça de barro da região. Produzia-se louça utilitária, cântaros, alguidares, vasos e muitas outras peças usadas no dia-a-dia pela população.
Contam os mais velhos que não havia família onde não existisse uma “cantareira”. Era das mãos das mulheres que saiam as famosas peças mas o processo de produção envolvia toda a família.
Primeiro era necessário colher o barro. Pelos montes da freguesia ou nos poços abertos nas minas de Paredes, procuravam-se os veios com o barro mais branco, diziam que era o melhor, o mais moldável. Os homens enchiam sacos com barro que, com a ajuda dos animais, transportavam para casa. Por norma esta recolha da matéria-prima acontecia em tempo quente, para a terra não guardar muita humidade. O barro era peneirado com os crivos da farinha, só o pó mais fino era aproveitado. O que sobrava, o barro mais grosso, era muitas vezes vendido pelas aldeias com a finalidade de esfregar os potes de ferro.
Mas este barro sozinho não possuía consistência suficiente para ser trabalhado para fazer louça. Era necessário acrescentar-lhe outro tipo de terra, por regra apanhada para os lados de Izeda, a que vulgarmente chamavam “o grosso” ou “fermento”. Era uma terra mais pastosa, que dava consistência ao barro de Pinela.
De seguida tudo devia ser bem misturado, até fazer “uma bola”, que devia repousar dois dias para expulsar a água que possuía a mais.
Só depois da “bola” pronta as cantareiras davam início ao processo criativo, de joelhos em torno da roda, começavam a dar forma à sua louça. A roda, muitas vezes animada pelos mais pequenos, devia manter uma velocidade elevada e constante, uma mudança na velocidade podia deitar a baixo a peça em construção. Um trabalho que exigia alguma mestria e muita concentração.
Preparadas as peças ainda precisavam de ir ao forno, para serem cozidas a elevadas temperaturas.
Em Pinela, em tempos, havia dois fornos de barro comunitários, atualmente resta apenas um. Porque o trabalho da cozedura exigia algum tempo e muita lenha, juntavam-se várias “cantareiras” para cozer a sua loiça em conjunto e não havia qualquer confusão porque cada qual possui a sua marca desenhada nas peças.
Carregar o forno era uma verdadeira arte. Em baixo colocavam-se as peças maiores e ia-se colocando louça até ao cimo.
Mais uma vez os homens iam ao monte recolher lenha para garantir a cozedura, muitas vezes urzes, que facilmente ardiam e criavam brasas suficientes para manter o forno com uma boa temperatura.
Durava horas este processo, por norma a cozedura fazia-se ao final da tarde para que a loiça pode-se permanecer toda a noite no forno e na manhã seguinte ser desenfornada.
A partir daí cada cantareira recolhia a sua louça, pronta para vender nas feiras ou de aldeia em aldeia.
Muitas vezes as próprias crianças participavam na fase das vendas. Empalhava-se o burro, único meio de transporte na época, e, carregado com loiça, lá iam de feira em feira.
Ainda há quem se recorde de regressar a casa não com dinheiro mas com bens. As trocas comerciais eram muitas vezes feitas com produtos, numa espécie de economia de partilha.

E como surgem as cantarinhas?

A louça de Pinela era habitualmente utilitária. Contam os mais velhos que as cantarinhas foram feitas para oferecer aos mais pequeninos, numa altura em que pouco havia para lhes dar. Pelo seu reduzido tamanho não tem outra utilidade que não seja a decorativa. Foi em Bragança, na Feira das Cantarinhas, que nasceu a tradição de oferecer cantarinhas às raparigas solteiras, as que recebessem mais cantarinhas seriam as mais pretendidas pelos rapazes da terra. A tradição mantém-se e, na Feira das Cantarinhas, é habitual comprar estas pequeninas peças para oferecer a quem se quer bem.
As originais, de Pinela, ainda existem graças a uma artesã que há cerca de uma década decidiu recuperar esta arte tradicional e manter o nome de Pinela associado à olaria.